Satisfação com a vida e suicídio

As medidas de "satisfação com a vida" em questionários tem sido muito criticadas. O que medem? Para que servem?

Um estudo finlandês publicado em 2001, mostra que as escalas de "satisfação com a vida" tem um alto poder preditivo em relação ao suicídio.
Uma amostra nacional de 29.173 adultos de 18 a 64 anos mostra que uma escala com quatro dimensões - interesse pela vida, felicidade, facilidade de vida e sentimento de solidão (que conta ao contrário) tem considerável valor preditivo até vinte anos depois. Não é estudo que, realisticamente, seja possível realizar no Brasil no futuro próximo.
O estudo foi complementado com dados do Registro Nacional de Mortalidade que permitiu cruzar os dados sobre a satisfação com a vida e os dados de mortalidade, inclusive por suicídios. As pessoas "insatisfeitas" com a vida foram comparadas com as "satisfeitas" usando regressões estatísticas (Cox regressions).

• Os resultados são robustos e impressionantes: os homens com mais baixo nível de satisfação tinham um risco relativo que era 24,85 vezes o dos homens com mais alto nível de satisfação durante os primeiros dez anos. Como seria de esperar, o impacto diminuiu com o tempo e foi mais forte durante a primeira década do que durante a segunda.
• O acesso aos dados individualizados permitiu que os autores verificassem que a relação persistia mesmo depois de controlar a idade, o gênero, a saúde, o consumo de álcool, a condição de fumante/não fumante e a atividade física, que são variáveis associadas com o suicídio. O risco relativo baixou para 1,74, mas continuou estatisticamente significativo no nível de 95% (hazard ratio=1,74, 95% CI=1.02-2.97).

A conclusão "grudada" nos dados diz apenas que a satisfação com a vida tem um notável impacto sobre a probabilidade de suicídio de longa duração, medida dez e vinte anos depois.

Porém, podemos ir mais longe:

Outros estudos mostram que a satisfação com a vida é muito influenciada pela saúde e parte significativa da associação com o suicídio passa pela saúde;
Passa, também, por outras variáveis associadas com a saúde e, também, diretamente associadas com o risco de suicídio, como consumir bebidas alcoólicas, fumar e não se exercitar;
As associações não são passageiras e temporárias: continuavam significativas dez e vinte anos mais tarde;

O que sugere que

• a satisfação com a vida tem certa estabilidade e quem era mais satisfeito tende a continuar mais satisfeito,
• e que, psicologicamente, as pessoas têm alguma dificulade em alterar seu nível de satisfação com a vida e a relação com variáveis relevantes, como o alcoolismo e a depressão;
• e que a estratificação de uma população pelo risco de suicídio também não muda consideravelmente a curto prazo;
• finalmente, como as teorias do suicídio já consagraram que os suicídios são oportunistas e têm "janelas", só teríamos a ganhar colocando as sub-teorias da oportunidade no bojo de uma teoria mais estável, associada com a a satisfação com a vida e seus caminhos.

O estudo pode ser consultado em

Heli Koivumaa-Honkanen; Risto Honkanen; Heimo Viinamaki; Kauko Heikkila; Jaakko Kaprio; Markku Koskenvuo."Life Satisfaction and Suicide: A 20-Year Follow-Up Study" em American Journal of Psychiatry, Março 2001 v158 i3 p433.


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