MASSACRES SEMELHANTES, MORTES DIFERENTES

Creio que a maioria dos leitores foi informada a respeito do ataque em uma escola americana em Newtown, quando vinte crianças foram chacinadas numa escola.

Entretanto, poucos sabem que na China, poucas horas antes do ataque em Newtown, um maníaco fez um ataque semelhante contra crianças chinesas numa escola primária. A arma foi uma faca.

Os escritores americanos Beth Brogan e Jon Queally rapidamente notaram que, além da semelhança – um maníaco que ataca uma escola primária – há uma diferença muito importante. No ataque na China todas as crianças sobreviveram. Dois acontecimentos semelhantes, a treze mil quilômetros de distância um do outro, com resultados tão diferentes. Como explicar a diferença, que se traduziu em vidas de crianças, mortas num país, salvas no outro?


A diferença não reside no local: nos Estados Unidos foi a Sandy Hook Elementary School; na província de Henan foi uma escola semelhante. Há muita semelhança entre os atores: claramente maníacos surtados. E certamente havia muita semelhança entre as vítimas: crianças de uma escola primária.

Então, o que explica as diferenças – vinte mortes em um lado e nenhuma no outro? 

As leis! Ding Xueliang argumenta que as leis e as políticas de controle de armas de fogo explicam a diferença: a acessibilidade das armas com alto poder letal nos Estados Unidos, incluindo rifles, metralhadoras, explosivos e armas de repetição, proibidas ou restritas em praticamente todos os demais países desenvolvidos. Os Estados Unidos são a exceção e seus cemitérios, com um número muito maior de vítimas inocentes, são o seu resultado. Nenhuma das 22 crianças atacadas na China havia morrido até o fim daquela semana. A foto é de uma delas em recuperação.

Um ataque sem vítimas, improvável nos Estados Unidos; um ataque com mais de vinte vitimas, improvável na China.

As leis chinesas controlam armas e munições. É um controle sério. Proibição simples e pura. Ding Xueliang explica que havia semelhanças psiquiátricas entre os dois agressores, mas os incidentes ocorreram em países com leis muito diferentes. Uma faca, mesmo com mais de vinte centímetros de comprimento, não é páreo para uma Sig Sauer, nem para uma Glock, nem para um M4. Essas três armas eram legalmente possuídas pela mãe do rampage killer e foram encontradas na cena do crime. Aliás, a mãe do rampage killer foi assassinada pelo filho usando uma das armas que ela tinha. Ironia final numa cultura que idolatra as armas de fogo. As crianças que sofreram cortes e ferimentos na China sobreviveram e um número, que se supõe muito maior, fugiu.

É possível reduzir as mortes violentas através de políticas públicas inteligentes. O Estatuto do Desarmamento reduziu muito a taxa de crescimento das mortes com armas de fogo. Em números absolutos, O crescimento anual observado foi de 2.072 mortes, de 1996 a 2002, mas, a partir de 2003, ano da promulgação do Estatuto, o crescimento anual baixou para 203, salvando mais de mil e oitocentas vidas por ano!

E na China? As leis continuam salvando chineses de todas as idades. A taxa de homicídios por 100 mil habitantes é baixíssima e continua baixando: foi de 2,3 em 1995; 2 em 2001 e 1,2 em 2008. Num país com o tamanho e as disparidades que tem a China, é uma grande conquista do direito humano mais fundamental, o direito à vida.

No que concerne as mortes intencionais violentas a China está no bloco dos países civilizados; os Estados Unidos, líder mundial em tantas outras áreas, estão fora dele.

Publicado n'O GLOBO de 5 de janeiro de 2013 sub o título de Fora da Ordem

 

 

GLÁUCIO ARY DILLON SOARES   IESP/UERJ

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