IDADE, ESQUIZOFRENIA E HOMICÍDIOS



Há medo e preconceito em relação aos doentes mentais. Porém, os doentes mentais, como um todo, são muito mais perigosos para a sua própria saúde do que para a saúde dos demais. O risco de que adolescentes esquizofrênicos tentem o suicídio é altíssimo, 50%. Os doentes mentais representam um risco menor para a nossa saúde ou para a nossa vida do que bêbados ou drogados.

A Criminologia tem pesquisado o elo entre doença mental e crime, particularmente os crimes violentos. E os dados impõem a conclusão de que os esquizofrênicos são mais propensos a praticar crimes violentos do que os não esquizofrênicos. A periculosidade de doentes mentais, particularmente de esquizofrênicos, depende de fatores externos a eles, como a cultura cívica, o acesso a tratamento e, também, o acesso a armas.
O risco de que um esquizofrênico busque armas e saia matando gente é multiplicado pela interação entre a doença e substâncias que afetam a mente e o comportamento, como o álcool (uma droga) e as drogas ilícitas, inclusive drogas consideradas suaves, como a maconha.
Sublinho o acesso e a continuidade do tratamento. Um estudo importantíssimo foi feito na Universidade de Sydney na Austrália. Denominado “Taxas de homicídio durante o primeiro episódio de psicose” (foi uma revisão e uma meta-análise das pesquisas existentes que satisfaziam exigências metodológicas), foi publicado no Schizophrenia Bulletin.
A que conclusões chegou esse estudo?
Que o tratamento faz muita diferença!
Começaram por averiguar qual é a taxa de homicídios cometidos por psicóticos. Depois, separaram os homicídios em dois grupos: os perpetrados antes do tratamento e os perpetrados durante ou depois do primeiro tratamento.
Estudaram 894 homicidas, diagnosticados como psicóticos, antes ou depois da violência. Desses, 349 (39%) cometeram os homicídios durante seu primeiro episódio psicótico.
É um dado muito importante: quatro em dez homicídios cometidos por psicóticos, foram cometidos antes de qualquer tratamento! Em muitos casos coincidiram com a primeira explosão. A faixa da idade em que a primeira explosão é mais frequente é, portanto, crucial para a prevenção da violência, particularmente dos homicídios.  


A relação entre esquizofrenia e a propensão a praticar crimes violentos, inclusive o homicídio, é uma das razões para manter alta a idade mínima para portar uma arma. O site Schizophrenia.com resume várias pesquisas, concluindo que a doença aparece entre 15 e 25 anos de idade. O pensamento sobre a idade mínima para comprar uma arma deve levar esse fato em consideração.   
É claro que o risco para qualquer um de ser morto por um esquizofrênico depende do número de esquizofrênicos.     
Quantos esquizofrênicos há? Segundo o NIMH, a prevalência é de aproximadamente 1,1% da população acima de 18 anos. Isso significaria que há, no mundo, cerca de 51 milhões de pessoas padecendo de esquizofrenia. Somente nos Estados Unidos, país onde há mais pesquisas sobre o tema, seriam 2,2 milhões. Uma estimativa grosseira, baseada na taxa americana, nos daria um milhão e quatrocentos mil esquizofrênicos na população brasileira de 15 anos e mais.
A existência de um sistema de saúde alerta para a detecção de esquizofrênicos e de uma população preparada para detectar a doença no seio da própria família são essenciais para evitar que esquizofrênicos cometam atos violentos. O risco de um esquizofrênico tratado matar alguém é 14 vezes menor do que o risco de um esquizofrênico não tratado.
Tragicamente, o SUS foi destruído muito antes de chegar a ser concluído. E a população brasileira tem um nível muito baixo de informação sobre doenças mentais. A combinação dessas duas deficiências é letal. Esperar até que um esquizofrênico tenha o primeiro episódio para proibi-lo de comprar armas equivale a condenar milhares de brasileiros a serem vítimas de homicídios.   


GLÁUCIO SOARES

IESP/UERJ

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