A Família, "Quebrar o pão" e seus benefícios


Os dados são impressionantes: nos Estados Unidos, em 1900, apenas 2% das refeições eram feitas fora de casa; em 2010 essa participação passou à metade. Pior: um em cada cinco cafés da manhã é consumido....no MacDonald's.
A família americana come junta três vezes por semana, cada refeição dura 20 minutos ou menos. Pior, uma indesejável alta percentagem é passada vendo a TV ou usando um celular, conversando ou enviando textos, ou simplemente jogando em pequenos aparelhos eletrônicos. Nada a ver com o conceito de "jantar em família".  A família passa a ser um conceito abstrato, relacionado com a origem biológica. Influi cada vez menos no comportamento de seus membros.
A indústria alimentícia e a de jogos eletrônicos estão destruíndo a família, cujo significado moral e psicológico se encolhe. Por que eu acho isso ruim?
Por que destroi um mecanismo de transmissão de valores e de controle de impulsos. Por que isso é ruim?
Por que há uma série de consequências negativas da ausência desses valores e desses controle.
As pesquisas mostram, sem lugar a dúvida, que as crianças que comem habitualmente com a família têm um risco de fumar que é a metade dos que não o fazem. Não é apenas o cigarro. Eles bebem menos, 42% menos. Também consomem menos maconha: 66% menos. 
As famílias protegem os meninos, mas as meninas são menos suscetíveis a problemas da adolescência, não é verdade? Não! As refeições em família reduzem muito o risco de bulímia, de anorexia nervosa e de pílulas para reduzir a fome e o peso. Quem come em família tem menos banha. Quem come em casa tem um risco menor de obesidade.
Pior: algumas dessas disfunções estão presentes muito cedo. Há menos crianças de quatro anos obesas entre as que comem com a família, dormem o suficiente e vêem pouca ou nenhuma TV nos dias de semana. As pressões da vida "moderna" e a redução do significado moral e psicológico da família reduziram o significado da família e a sua capacidade protetora. Vemos, crescentemente, a terceirização da criação dos filhos, seja através de outros parentes (menos mal), de empregadas e babás, e dos jogos e da TV. Esses processos nos dizem muito  a respeito da própria família e dos valores e do sentimento de responsabilidade dos pais.
A indústria do processamento de alimentos mudou nossa dieta - para pior. A mudança foi intencional e obedece ao requisito laboral de reduzir o tempo destinado às refeições. O que os nutricionistas e os médicos recomendam, assim como os educadores, entra em choque com o que fazemos na vida real.
Há cerca de cem anos quase tudo o que comíamos era produzido localmente, era orgânico, eram alimentos integrais. Não havia cadeias de comidas rápidas, não havia comida congelada: havia apenas o que mães e pais, avós e avôs faziam, e a maioria das refeições importantes era feita em conjunto, todos, ou quase todos, juntos. O jantar familiar é uma importante e saudável tradição que está se perdendo. É o  lugar e momento de conversar sobre os problemas de todos, de aconselhar, de apoiar, de redirecionar. 
Não pretendemos voltar ao passado, mas recuperar as tradições mais saudáveis e úteis do passado. 
Algumas medidas são essenciais:
redescubra e recupere a sua cozinha e elimine o que, demonstradamente, faz mal: gorduras hidrogenadas, excesso de açúcar, banha e gordura. Encha sua cozinha com comidas recentes, se possível colhidas recentemente, se possível não processadas industrialmente.
Recrie o jantar em família. Uma leitura interessante é o livro de Laurie David The Family Dinner. Ela sugere hora certa, ajudando a reestabelecer os rítmos circadianos. Nada de TV, jogos eletrônicos, telefones e celulares durante o jantar. Jante com a família, não na frente dela. Esqueça os refrigerantes. Use água, preferivelmente filtrada. Faça do jantar uma pequena cerimônia familiar. Convide amigos. Converse. 
Comam juntos. Esse é o momento para dividir a vida, no qual muito do conhecimento se transmite, onde a sociabilidade positiva cresce. 
Aprenda ou reaprenda a cozinhar. Isso vale para todos na casa: até crianças podem ajudar na cozinha. Não há necessidade de comer sempre, pratos elaborados e trabalhosos.
Plante um jardim. Isso pode ser feito em recintos relativamente pequenos. Se houver espaço, plante árvores frutíferas que dão pouco trabalho. 
Um milagre seria conseguir voltar ao tempo de hortas coletivas. Há mais tempo para trocas e para criar um espírito comunitário.
Aprenda a conservar, preservar, reciclar. Parte do lixo pode ser usada como adubo. Alguns fazem isso usando minhocas.
Recupere o que havia de mais positivo nos hábitos de gerações anteriores. Lembre-se de que compartir o pão afugenta a solidão.

GLÁUCIO SOARES             IESP-UERJ

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