A Morte sobre Rodas


A Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro realizou o Io Seminário sobre os Caminhos da Educação e Segurança no Transito. Iniciativa necessária, que deveria ser reproduzida em todo o país. Por que seria tão importante? Porque a matança no trânsito em nosso país é grande, por um lado, e políticas públicas reduzem a matança, pelo outro. Em 2008 morreram 39.211 pessoas no trânsito no Brasil. Quase quarenta mil pessoas. O que significa esse número? Em 2009, o Corpo de Bombeiros autorizou que até 24.600 pessoas assistissem a jogos e espetáculos no Estádio de São Januário. Ou seja, morrem o equivalente a um Estádio de São Januário e meio, lotado, todos os anos. 
Podemos diminuir essa mortandade? 
Podemos! Os dados demonstram, sem qualquer lugar a dúvidas, que políticas públicas implementadas por governos centrais, estaduais e municipais reduziram essa carnificina em diferentes países. 
A redução é facilitada por algumas características dos “acidentes” (que nada têm de acidentais): são fenômenos estáveis, que se repetem, ano a ano, com atores individuais diferentes, mas com características semelhantes. Tomemos a razão entre as taxas masculinas e femininas. Entre 1996 e 2008, período com o mesmo padrão de classificação (CID 10) e com dados completos (2009 e 2010 ainda estão sendo revistos), a razão variou pouco – de 3,8, em 1996 a 4,7 em 2007. A média da razão de 4,4 (masculinas) pelas femininas e o baixíssimo desvio padrão (0,284) sugerem que o fenômeno tem estruturas semelhantes para homens e mulheres.
Cada ano, aproximadamente a mesma proporção de homens e mulheres é vitimada, pelas mesmas razões. O fenômeno também é repetitivo em outros detalhes: a distribuição por idades, a distribuição por tipo de veiculo (mas há mudanças, como o recente crescimento acelerado de acidentes, feridos e mortos em motos), a distribuição no espaço, o papel do alcoolismo e de outras drogas, o papel do sono, o papel da imprudência, o papel da velocidade, da impunidade e muito mais, o que possibilita políticas públicasfocalizadas, centradas em cada uma dessas correlatas da morte. 
É conhecido o sucesso do programa Paz no Trânsito que reduziu à metade, em apenas quatro anos, a taxa de mortos por dez mil veículos no DF.
Em números absolutos, desde 1980 até a administração de Cristovam, os mortos no trânsito cresciam cerca de trinta e três por ano; durante aquela administração decresceram 82 por ano, e após aquela administração não há ajuste aceitável que revele uma tendência – no número absoluto, reitero. Comparando antes e durante a  administração de Cristovam, podemos ver os resultados.





Aliás, no Brasil como um todo, dado o crescimento rápido da frota e o crescimento lento da população, calcular a taxa de acidentes, feridos ou mortos, pela população, provoca distorções nos dados históricos. Não há colisões de automóveis sem automóveis... Entre 1998 e 2010, a população brasileira aumentou muito menos do que a frota de veículos. A população de 2010 é 118% a de 1998, ao passo que a frota é 266%. As duas variáveis contam. Porém, veículo parado não colide nem atropela, razão pela qual os países com melhores estatísticas calculam a taxa por bilhão de milhas rodadas.
Algumas medidas reduzem vários males: o programa de contenção do alcoolismo de Gorbachev reduziu as mortes no trânsito, as causadas por outros acidentes, as causadas por homicídios, as causadas por suicídios e as causadas por cirrose hepática em quase todos os membros da antiga União Soviética. Em Diadema, houve redução nas taxas de homicídio, de mortes no trânsito e de violência doméstica: efeitos da Lei Seca.   
Porém, o progresso político não é linear: há retrocessos; nos Estados Unidos, governos reacionários foram contra os limites de velocidade e os aboliram ou aumentaram; no Brasil, essas posições são apresentadas como parte de uma síndrome de esquerda. 
Em 1995, nos Estados Unidos, o governo federal aboliu os limites de velocidade nas rodovias interestaduais, no que foi seguido por 32 estados que aumentaram suas velocidades máximas.
O que aconteceu? Qual o resultado?
      As mortes nessas rodovias aumentaram em 15%, provocando um aumento entre 450 e 500 mortes cada ano;
      Em 2003, a maioria dos estados já tinha aumentado o limite de velocidade nas estradas rurais, o que provocou um aumento anual de 38% nas mortes:
      Se os americanos adotassem os padrões britânicos de velocidade máxima, perto de dez mil americanos não teriam morrido – mais de três vezes os que morreram nos ataques às Torres Gêmeas.
Há outros casos de reversão: Boris Yeltsin, um alcoólatra, reverteu a política de controle do alcoolismo de Gorbatchev. Rapidamente, as taxas de mortes violentas voltaram a crescer.
A influência das políticas públicas é evidente. Bons governos salvam vidas!
 
Gláucio Ary Dillon Soares
IESP-UERJ

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